Quero agradecer ao Ministério da Igualdade, Senhora Ministra, e à Direção Geral da Diversidade Sexual e Direitos LGBTI, Senhora Diretora, pela audácia de me dar a oportunidade, porque suponho que sabiam que eu a aproveitaria.
Acredito que este país não será democrático até que acabemos com a monarquia. E acredito que ninguém neste país estará livre até que as CIE [Centros de Internação de Estrangeiros] sejam fechadas, a lei de imigração seja revogada, todas as pessoas em situação irregular sejam regularizadas e que as pessoas parem de serem assassinadas nas fronteiras.
Mas vocês me deram este prêmio de visibilidade lésbica, vês, senhora, como era necessário dizer que eu era sapatão o tempo todo? E por insistir que os direitos das pessoas trans são justiça, e que viver isso como uma ameaça começa com f e termina com ismo, mas não é feminismo.
Então eu quero agradecer: mãe, pai, família, eu te amo. Obrigado por dizer “o que importa para nós é que você seja feliz” quando você não sabia muito bem o que dizer. A minhas amigas e irmãs da Pikara Magazine, estou viva por causa de vocês.
Às mulheres que me ensinaram a entender, amar e trepar. Às minhas companheiras de Mimosa, que me ajudam a fazer meu trabalho parecer com meus sonhos. Às organizações e profissionais que me apoiam quando sou atacada. Aos que me incentivam e me apoiam nas ruas e nas redes, por vocês não afundo. Ao público, que me deixa sair há oito anos, ainda que eu faça o que me der na telha. E aos meus amigos cisheteros que ficaram, por tentar ficar.
Mas sobretudo, sempre, à luta coletiva. Ao movimento feminista, que nos ensinou a ver a violência e não a confundir com nosso destino. À luta LGBTQI, por colocar os corpos, as vidas, as resistências e as plumas contra esse sistema que nos odeia, nos teme, nos ataca e nos mata por sermos o que somos. E por tentarmos ser feliz, melhor que o normal, por inventar famílias escolhidas e pela autodefesa, porque a polícia não nos protege, nem o sistema de saúde, nem o de educação, ou nenhuma instituição que nos tolere apenas se fingirmos o que não somos.
Sapatões, bichas, travestis, transformistas e “mas, o que você é?”, todes dissidentes, vamos dar um jeito de ser livres ou vamos queimar tudo!
Olha, Ibon, acontece que íamos nos vingar sendo felizes e livres.
A todos aquelas que nos têm matado e continuam a nos matar, a Marielle [Franco], a Francis, a todos aqueles que tiveram que viver escondidas, fingindo, assustadas. Para aqueles que não têm escolha a não ser continuar se escondendo.
Estamos aqui para lhe prometer que nem nossos corpos, nem nossas vidas, nem nossas formas de trepar se ajoelharão diante do sistema cisheteropatriarcal.
Discurso de Irantzu Varela publicado em Pikara online magazine em 29 de junho de 2022. Disponível em: https://www.pikaramagazine.com/2022/06/irantzu-varela-si-hacia-falta-decir-que-soy-bollera/
Tradução: Luiz Morando
